jueves, 11 de noviembre de 2010

Mesmo na idade adulta, alfabetização promove reorganização do cérebro



Há 'competição' no córtex visual entre a atividade nova e as mais antigas.
Estudo internacional com participação brasileira analisou 63 voluntários.

Do G1, em São Paulo
Estudo analisou 41 brasileiros e 22 portuguesesPesquisa mapeou cérebro de 41 brasileiros e 22 portugueses (foto: cortesia Rede SARAH)
A alfabetização reorganiza o cérebro mesmo quando a pessoa aprende a ler já adulta. Cientistas compararam a atividade cerebral de analfabetos com a de alfabetizados e verificaram que aprender a ler altera funções do córtex. Córtex é a camada periférica dos hemisférios cerebrais, sede de funções nervosas elaboradas, como os movimentos voluntários.
Como a escrita é invenção relativamente recente na história da humanidade, não é possível afirmar que tenha influenciado a evolução genética do cérebro humano. “O seu aprendizado pode originar-se na reciclagem de regiões cerebrais preexistentes e reservadas a outras funções, porém suficientemente plásticas para passar a dedicar-se à identificação dos sinais escritos e à sua ligação com a linguagem falada”, diz Lucia Willadino Braga, neurocientista com pós-doutorado no Hôpital de la Pitié-Salpêtrière, na França, e uma das coordenadoras da pesquisa.
O córtex visual reorganiza-se quando a pessoa aprende a ler por meio de uma “competição” entre a atividade nova de leitura e as atividades mais antigas de reconhecimento de faces e de objetos. Durante a alfabetização, a resposta às faces diminui levemente à medida que a competência de leitura aumenta na área visual do hemisfério esquerdo. Ou seja, a ativação às faces desloca-se parcialmente para o hemisfério direito. Não se sabe, ainda, se essa competição tem consequências funcionais para o reconhecimento ou a memória de faces.
No caso dos analfabetos, essa área visual do hemisfério esquerdo, que nos leitores descodifica as palavras escritas, só controla o reconhecimento visual de objetos e de faces.
Como a pesquisa foi feita
O estudo analisou com ressonância magnética funcional a atividade cerebral na totalidade do córtex de 41 voluntários brasileiros e 22 portugueses. Do total de 63 participantes, 10 eram analfabetos, 22 foram alfabetizados na idade adulta e 31, na infância. Eles foram submetidos a uma bateria de estímulos, como frases faladas e escritas, palavras faladas, rostos e objetos.
Como a maioria dos efeitos do aprendizado da leitura no córtex cerebral é visível tanto nas pessoas escolarizadas na infância quanto nas que foram alfabetizadas na idade adulta, o grupo concluiu que os circuitos da leitura permanecem plásticos durante a vida toda.
Lucia é presidente da Associação das Pioneiras Sociais - que mantém a Rede SARAH de Hospitais de Reabilitação, com sede em Brasília - e pesquisadora do Centro Internacional de Neurociências da rede, onde os voluntários brasileiros foram analisados. Pesquisadores da França (Centro NeuroSpin de neurociências, College de France, Faculdade de Medicina Pitié-Salpetriere), Bélgica (Universidade Livre de Bruxelas) e Portugal (Universidade de Lisboa) também integraram o projeto.
Os resultados estão na edição desta semana da revista “Science”, que começa a circular amanhã .

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